quinta-feira, 22 de setembro de 2011

DOCUMENTOS: Aldeias do concelho de Valpaços nos meados do século XVIII por freguesias – LEBUÇÃO

Por Leonel Salvado


MEMÓRIAS PAROQUIAIS, 1758, Tomo 20, LEBUÇÃO, Monforte de Rio Livre
[Cota actual: Memórias paroquiais, vol. 20, n.º 71, p. 527 a 540]


Resposta
De um papel que me foi enviado da parte do muito Reverendo Doutor Arcipreste e Abade de Monforte, o qual eu recebi da mão do Padre José Caetano Álvares Parada, Cura coadjutor do Reverendo Reitor de Castanheira e o mesmo papel contém sessenta interrogatórios divididos em três capítulos, no primeiro dos quais se acham vinte e sete, no segundo treze e no terceiro vinte, os quais se acharão aqui fielmente trasladados com suas respostas deles congruentes.
Este lugar, donde vai este papel, que se chama Lebução, fica na Província de Trás-os-Montes, Bispado de Miranda do Douro, Comarca de Torre de Moncorvo, termo de Monforte de Rio Livre, freguesia de São Nicolau.
O senhor deste lugar, e dos mais deste distrito, é o Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Conde de Valadares e quais sejam estes no tempo presente não se sabe responder. O Comendador é o Excelentíssimo conde de Valadares e o Donatário é o Ilustríssimo conde de Atouguia.
Este lugar tem oitenta e quatro vizinhos e o número de trezentas pessoas e tem mais três anexas que, com as pessoas deste lugar, constituem uma mesma freguesia: digo que se chama uma delas Pedome, que se compõe de dezasseis [fogos] e cinquenta e uma pessoas; outra se chama Moreiras, na qual se contam oito moradores e trinta e três pessoas; e mais outra anexa chamada Ferreiros, dividida em dois distritos que os distinguem com os nomes de Ferreiros de Baixo e Ferreiros de Cima, e é este composto de dezoito vizinhos e cinquenta e três pessoas e, aquele, de cinco moradores e dezoito pessoas, o que, tudo junto, faz o número de cento e trinta e um fogos contra cento e cinquenta e cinco pessoas.
Este lugar de Lebução está situado num baixo que é próximo de um vale, pois está numa situação em que tem muitos altos e baixos, estando as moradas que ficam na parte do Sul firmadas em terra sólida e áspera e as que ficam para parte do Norte estão fundamentadas em pedra firme. E dele não se descobrem outras povoações mais do que um lugar chamado Parada que é anexa do sítio da Castanheira, que lhe fica da parte de Nascente e também os dois lugarzinhos de Ferreiros que compõem o mesmo corpo com esta freguesia e ficam da mesma parte do Oriente e se descobrem do mesmo sítio donde se vê Parada. De algumas partes deste lugar se registam também as igrejas de São Sebastião e São João Baptista que são do lugar de Cima de Vila de Castanheira, e de Nossa Senhora da Expectação, chamada nesta terra da Orada, que é de Sanfins da Castanheira, as quais se vêem todas elas para a parte do Norte, vendo-as deste sítio que delas fica distanciado três quartos de légua; e é igual a distância entre Lebução e Parada.
Tem termo seu e compreende quatro lugares, sendo o principal deles Lebução, aonde está a matriz, na qual assistem à missa os moradores de Pedome, Moreiras e Ferreiros, cujos vizinhos e pessoas já foram numerados. O termo deste lugar e suas anexas terá uma légua e meia certa, dividindo-as pela parte do Poente um ribeiro que nasce no lugar de Dadim e morre noutra aldeia chamada o Pereiro, cujas águas se juntam num sítio chamado Valados, o qual aparta este termo do de Tronco pela parte do Poente, como já disse. E a parte do Sul termina num alto que encobre a vista neste lugar, impedindo-lhe de ver onde e o que fica para semelhante parte, no qual alto pega com o termo de Fiães que dista deste um quarto de légua. E da parte de Nascente pega com o termo de Vilartão no mesmo alto atrás mencionado de Sul. De Oriente se divide e separa num regato que desce do mesmo alto e passa por este lugar de Lebução, ficando da parte de Sul, a respeito de tal regato. E mais, da parte Norte, respectiva ao dito regato, margina o dito termo com o de Sanfins, Mosteiro e Cima de Vila da Castanheira, uma parte de cujos termos e também do de Santa Comba se avistam deste lugar.
A Paróquia está fora do lugar para a parte de Poente, afastada das primeiras casas a um tiro de espingarda e os lugares ou aldeias que contém já foram declarados.
O orago é São Nicolau, cuja festa se celebra aos seis de Dezembro e tem quatro altares, o maior do mesmo São Nicolau no qual está uma tribuna e um retábulo muito bem dourado e além da imagem do dito santo, que está da parte do Evangelho, se acha outra de São Pedro à parte da Epístola e tem mais três altares colaterais, sendo um deles de Santo António, que fica do lado da Epístola, e no mesmo altar está também a imagem de São Sebastião, e do outro lado, arrimado ao mesmo arco da capela-mor em correspondência do de Santo António, fica o de Nossa Senhora do Rosário e para a mesma parte fica também o do Santo Nome de Jesus metido numa capela sua muito dourada dentro de um arco que firma com superfície interior da mesma igreja. Neste altar está uma venerável imagem de um crucifixo coberta com sua cortina. Nesta mesma capela e altar está erigida uma Confraria chamada das Almas que terá o número de quatrocentos e cinquenta Irmãos que paga cada um deles, para ela, meio alqueire de centeio todos os anos e tem cinco Jubileus e dois Aniversários. E todas estas referidas imagens são de vulto e não há de manto. Não tem naves a dita igreja. Só tem duas sacristias, uma aonde se guarda os ornatos, mais para o canto da dita igreja, a qual abre a sua porta para a capela-mor que fica da parte do Evangelho, e dentro dela está outra cuja porta abre para o corpo da igreja e serve para nela se arrecadarem alguns trastes que são desta mesma igreja e também para servir para o roupeiro que nela está.
O pároco é cura que terá de renda cinquenta até sessenta mil réis, o qual é apresentado pelo Reverendo Reitor de São João Baptista de Castanheira que leva cento e cinquenta mil réis de renda e meados conforme, o qual Benefício é da igreja do Padroado Real.
Tem três ermidas, cada uma pertencente à sua povoação: A de Santa Marinha que fica em um altinho e pertence ao lugar de Ferreiros, da qual fica a povoação a quatro tiros de espingarda; na de Moreira se acha outra fundada como sendo do Anjo da Guarda, que está vizinha às casas, porém fora de portada; Em Pedome se acha outra com a invocação de São Marcos, a qual está dentro da povoação e todas estas têm imagens de vulto, cada uma delas a sua, debaixo de cujas rendas foram erigidas, sendo estas muito pobres. A todas se lhe faz somente uma missa cantada com quatro clérigos no dia em que se celebra o santo de cada uma delas. A nenhuma delas acodem romagens.
Os frutos que esta terra produz mais copiosamente são centeio, castanha e vinho, ainda que de todas mais dê, mas com menos fertilidade.
Tem juiz ordinário que com o procurador, vereadores e almoxarife fazem corpo de câmara que é independente de outro governo no que respeita aos seus acórdãos  e determinações, suposto se indica do seu governo e corregedor da Torre de Moncorvo que é cabeça de comarca. E também dele se apelam os demais para a Ouvidoria de Vinhais que também é pertencente às terras do Ilustríssimo e Excelentíssimo conde de Atouguia e ele é que prove os que servem de ouvidores da dita Vila de Vinhais.
Não tem correio e serve-se esta terra do correio de Chaves, aonde chega na quarta feira por todo o dia e dali parte ao Domingo de tarde e dista esta terra de Chaves, aonde ele chega, três léguas.
Da capital de Bispado, que é Miranda do Douro, dista dezoito léguas e da capital Lisboa setenta.
Na Vila de Monforte, de cujo domínio é este lugar, se acha um castelo dentro dos muros de sua jurisdição que está presidiado com um Governador e alguns soldados pagos por Sua Majestade, que Deus guarde. O estado com que se acha ao presente o castelo, como as muralhas, dirá o Reverendo Abade de Monforte que tem sua morada contígua aos ditos muros.
O terramoto [de 1755] posto que causou revolta e grande susto a todos os viventes, nenhum deles experimentou a sua ruína nem caiu edifício algum.
E não há [mais] coisa digna de memória que seja de descrever-se neste papel. […]
Por não haver serra, não tenho que dizer.
Pela parte do Poente e margens das terras de Tronco corre um regato que neste lugar se lhe pode chamar rio, o qual nasce num sítio chamado Pereiro que é termo de Cima de Vila de Castanheira e este se junta com as águas do lugar de Dadim aonde chamam Valados, as quais juntas e incorporadas umas nas outras fenecem o regatinho que por diminuição não tem nome distinto e vai formando um ribeiro com elas que se chama ribeiro da Pulga no qual há infinitos moinhos. E tem o tal regato uma légua de comprimento, de onde nasce, que é na parte do Norte, até quando chega ao lugar de Pedome, anexa desta freguesia e ali tem uma ponte de pedra e de pau, onde se passa para o lugar de Tronco.
E logo mais abaixo tem outra ponte que é somente de pedra e que fica na estrada Real que vai de Chaves para Bragança. Este ribeiro vai dilatando seu curso, que é presente em todo o ano, por uma veiga abaixo que é termo de Nozelos e Tinhela a cujos lugares corre vizinho. Porém, ao de Tinhela se avizinha mais aonde tem uma ponte melhor do que as outras de que acima falámos, pela qual entram e saem os que vão e vêm da parte do Sul para cujo lado fica a dita ponte a respeito do tal lugar. E da parte do Sul tem princípio outro regato, porém muito menos caudaloso do que este outro de que até agora temos tratado, o qual nasce no mesmo termo de Lebução num sítio chamado Vale de [?] e se vai formando de alguns regatinhos que ficam da mesma parte do Sul de cujo alto descem as águas ao lugar de Lebução e delas se forma o dito ribeiro com que se regam os prados deste lugar, abaixo do qual, a meio quarto de légua, se lhe junta outro ribeiro que nasce em Moreiras aonde chamam de Telhas, termo do mesmo lugar, que da parte de Poente vem correndo ao Sul, à distância de um quarto de légua, aonde, junto com o que vai de Lebução, vão correndo na direcção de Poente a Nascente. E do sítio em que se juntam no dito lugar, que se chama do Amieiral, sempre tem água ainda que nos meses de Março, Agosto e Setembro poucas vezes se veja correr, e vai desaguar perto das margens do dito termo, que será meia légua de distância, noutro ribeiro maior que tem seu princípio na fonte do Ribeiral que fica perto da ponte de pedra no termo do lugar de Cima de Vila, para a parte do Norte, de onde vai correndo e recebendo algumas águas de outras fontes e regatos até ao sítio chamado Entre-Moinhos aonde se junta com o mencionado ribeiro de Lebução que terá de medida três quartos de légua quando com ele se incorpora.
E aí perde o de Lebução o seu nome, chamando-se dali para baixo ribeiro de Paradas por respeito a este lugar que lhe fica do lado de cima, à parte do Norte, e assim vai correndo à distância de uma légua por terra mais dura e a ribeira fica com seu curso mais arrebatado e vai morrer num rio chamado Mouce que termina e divide o concelho de Lomba do de Monforte.
Tomando o nome de serra por todo este País, as plantas de que é [a freguesia de Lebução] mais abundante, sendo frutíferas, são castanheiros, macieiras, pereiras, cerejeiras, pessegueiros, figueiras e vinhas; e, sendo silvestres, são carvalhos, amieiros, salgueiros e giestas. Também cria algumas ervas medicinais, como são a salva, o alecrim, a arruda, a lorna, a cidreira e outras muitas cujos nomes ignoro.
No termo desta freguesia se cultiva alguns pedaços do campo que se recorre para através de alguns deles, de que é bastante agreste e estéril, assim os fazer que produzam com maior fertilidade de centeio, castanha e vinho.
É bem temperado este território e ordinariamente sadio em seu clima. E tem abundância de águas com que refrescar nos meses de Verão. Nela [serra/nele território] se criam alguns gados graúdos como bezerros e alguns miúdos como ovelhas e cabras, ainda que estes sejam pequenos e ruins. Criam-se também muitos porcos cujas carnes são de admirável gosto por serem cebados com castanha. Criam-se também muitas galinhas e capões e alguns perus e patos. Há também nela perdizes, coelhos lebres, lobos e raposas.
Como depois de ler primeiramente este papel que da parte do Reverendo Doutor Arcipreste me foi remetido e não achar nela muito por mim a saber outra coisa alguma digna de memória que nele não viesse advertida, conclui a resposta como seguro disso, a qual compreende tudo o que achei neste termo de que pudesse falar.
E para fé desta verdade me assino, em Lebução, catorze de Abril de mil e setecentos e cinquenta e oito anos.

O Padre António Fernandes d’Além
Cura de Lebução
[não assinaram testemunhas]

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