sábado, 14 de agosto de 2010

Francisco José de Medeiros

Por Leonel Salvado



Esta importante figura da História Portuguesa, de relevância Local, Regional e Nacional, que nasceu no dia 30 de Abril de 1845 em Valpaços, ainda aldeia (embora já cabeça de concelho desde 1836), e que se fez notar como um dos mais conceituados juristas e políticos do seu tempo, é uma referência bem conhecida dos seus conterrâneos que lhe renderam uma justa homenagem na toponímia da vila (hoje cidade), ao baptizar uma das suas ruas com o seu nome (a Rua Dr. Francisco José de Medeiros). Além disso, o seu nome e a sua obra têm sido merecidamente imortalizados em variadas publicações, quer de natureza monográfica, quer essencialmente biográfica, pelo que muito pouco do que aqui dele me proponho referir será certamente inédito, salvo, talvez, o complemento ilustrativo que entendi apresentar aos leitores do Clube de História e que, em grande parte, só foi possível graças à cortesia e natural disposição filantrópica do Sr. Manuel Medeiros, que não hesitou em autorizar a publicação da foto de família que encabeça este artigo dedicado à memória do seu ilustre antepassado.


Notas biográficas
Subscrevendo as palavras do Padre João Vaz de Amorim na revista Aquae Flaviae, que já foram transcritas por José Lourenço Montanha de Andrade em Valpaço-Lo-Velho, caderno cultural 6, editado pela Câmara Municipal em Agosto de 2001, Francisco José Medeiros «ocupou lugar primacial como homem de categoria social, que pelas suas altas qualidades de carácter, soube honrar esta boa terra [Valpaços] que o viu nascer.»

Segundo as notas biográficas de A. Veloso Martins, na Monografia de Valpaços, e as que se acham no I Volume do Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses, coordenado por Barroso da Fonte, Francisco José de Medeiros frequentou o curso de Direito na Universidade de Coimbra, com assinalável distinção e aprovação, fazendo-se já notar pela sua dedicação literária, publicando uma sebenta estudantil em matéria de Direito e um artigo intitulado Alimentos que foi publicado na revista Legislação e Jurisprudência, recebendo os melhores elogios da parte do seu director, o Professor Chaves e Castro. Decidido a seguir a carreira da magistratura, ingressa no Ministério Público e em 1871 foi nomeado Delegadodo Procurador Régio e colocado na ilha Graciosa  obtendo desde então uma rápida progressão na magistratura. De regresso ao continente, em 1876 desempenhou estas mesmas funções nas comarcas de Fafe, Mirandela e Chaves. Em 1886, foi promovido a juiz de Direito de 1.ª Instância de 2.ª classe e, em 1889 ainda exercia essa função na comarca de Cantanhede. Foi depois promovido a juiz de Direito de 1.ª classe exercendo nas comarcas de Arouca, Cinfães, e em várias varas do Porto (1895) e de Lisboa. Em 1901 ascendeu à segunda instância nomeado juiz da Relação dos Açores. Em 1904 foi transferido para o Tribunal da Relação do Porto e ainda nesse ano para o de Lisboa, vindo a ser nomeado vice-presidente desta instituição a 13 de Setembro de 1910 e a Presidente, por Decreto de 25 de Outubro do mesmo ano. 

Entretanto, havia-se afeiçoado à vida política, chegando a ser, em Valpaços,  uma das figuras de proa do Partido Progressista, eleito por várias vezes deputado às Cortes Constituintes pelo círculo desta sua terra natal, a primeira delas em 1879 e em várias outras legislaturas, até 1904, desde que prestou juramento a 14 de Janeiro de 1880. Foi depois, em 1887 nomeado Secretário da Câmara dos Deputados e, por carta-régia de 4 de Abril de 1906, é elevado ao pariato, isto é a membro da Câmara dos Pares, também designada por Câmara Alta, categoria geralmente atribuída às mais gradas figuras da aristocracia. Foi nessa qualidade que, em 1907, Francisco José de Medeiros revelou as mais claras provas do seu espírito liberal e democrático ao insurgir-se abertamente contra a ditadura de João Franco.

Em 1909 integrava o Ministério de Venceslau de Lima, sobraçando a pasta da Justiça. Foi enquanto Ministro da Justiça que procurou materializar um conjunto de arrojados projectos, na mesma linha ideológica liberal e democrática a que sempre se manteve fiel, projectos esses apontados a uma verdadeira reforma do processo penal e da organização judiciária. Assim, apresentou uma série de propostas de lei nas mais diversas matérias, tais como a de responsabilidade ministerial, processo penal, organização judiciária, júri criminal, liberdade de imprensa e casas de correcção para menores. Foi também enquanto Ministro da Justiça que a sua firmeza de carácter lhe acarretou alguns dissabores. Deu-se o caso que o Bispo de Beja, D. Sebastião de Vasconcelos, desavindo com o Vice-Reitor do respectivo Seminário e seu irmão os demitiu do cargo e do exercício do magistério. Apelando ao Governo, os professores foram ouvidos pelo ministro Medeiros que se mostrou favorável às razões das suas queixas e logo insistiu junto do Bispo para que os reintegrasse. Perante a intransigência de D. Sebastião de Vasconcelos em proceder de acordo com as suas instruções, o Ministro da Justiça expediu ao Conselho de Ministros uma portaria com vista à reintegração dos padres queixosos. Como a tal Portaria se opusessem o Presidente do Conselho, Venceslau de Lima, e a própria rainha, D. Amélia, Francisco José de Medeiros, sempre fiel aos seus princípios, entendeu pedir a demissão, abandonando o Ministério nos finais de Outubro de 1909 e sendo substituído na pasta da Justiça pelo Conselheiro Artur Pinto de Miranda Montenegro. A questão, então conhecido por «Questão do Bispo de Beja» e, sobretudo o ousado ataque frontal de Medeiros às mais altas dignidades episcopais que, impunemente se insinuavam no direito de se imiscuírem nas prerrogativas do poder civil, serviram de motivos para que o juiz Medeiros fosse constantemente criticado, na sua pessoa e na qualidade dos seus serviços no Ministério de que se demitira, por parte da imprensa católica e do julgamento a que esta deu lugar relativamente à mesma pessoa por parte de alguns historiadores. Este movimento difamatório tinha porém os dias contados, como contados estavam os dias da monarquia e esbarrou sempre contra uma mole de portugueses que comungavam dos mesmos princípios democráticos do ex-ministro valpacense. Efectivamente, com o advento da República Francisco José de Medeiros viria reabilitadas as suas qualidades morais e políticas em nome das quais os membros do Governo Provisório da República entenderam propor a nomeação do «ex-ministro da Monarquia para o sempre cobiçado cargo de Presidente do Supremo Tribunal de Justiça» (A. Veloso Martins, ob cit), o que se concretizou no ano de 1912 em que Medeiros começou por juiz conselheiro do mesmo e logo depois para suceder a Augusto Carlos Cardoso Pinto Osório na direcção deste órgão máximo do poder judicial, passando a figurar como o seu décimo quarto presidente, desde a sua criação, em 1833, então presidida por José da Silva Carvalho (S.T.J. http://www.stj.pt/?idm=67).


Breves notas genealógicas
É ponto assente que Francisco José de Medeiros nasceu em Valpaços, no dia 30 de Abril de 1845 e faleceu em Sabrosa, a 6 de Maio de 1912. Era filho de Manuel Joaquim de Medeiros e Angélica Teresa Sonim e neto paterno de Francisco Medeiros e de sua mulher, Madalena Nogueira, moradores em Valpaços nos finais do século XVIII, dos quais descende, por linha varonil legítima, a actual família Medeiros desta cidade. Era neto materno de Luís António Sonim e Maria Filipa. Casou primeiro com Elisa de Barros da Silva Leal, casamento de que não houve filhos e, em segundas núpcias, com D.ª Cândida Raquel de Barros Beça Botelho Castelo-Branco - irmã de D. Maria das Dores, casada com o Dr. José Coelho Mourão Teixiera de Carvalho e ambas filhas de Álvaro Xavier de Barros Botelho Ribeiro de Moraes Sarmento. Deste segundo casamento existiu uma única filha, Maria de Barros de Medeiros, que se casou com seu primo João de Barros Botelho Coelho Mourão, havendo deles descendência.

Fontes:
http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=178117
Supremo Tribunal de Justiça - S.T.J. http://www.stj.pt/
Tribunal da Relação de Lisboa - http://www.trl.mj.pt
O concelho de Valpaços, por Valbel (Joaquim de Castro Lobo), 1954, Lourenço Marques, pp. 79-80


2 comentários:

  1. Boa noite Sr. Leonel Salgado.
    Sou seminarista da Diocese de Beja, e estando a realizar um trabalho sobre a questão dos Padres Ançã entre o Ministério da Justiça e o outrora Bispo de Beja, D. Sabastião de Leite Vasconcelos, deparei-me com as suas informações que desconhecia. Se fosse possível ficaria-lhe muito grato se me desse a fonte de onde tirou a seguinte afirmação: "Como a tal Portaria se opuseram o Presidente do Conselho, Venceslau de Lima e a própria rainha, D. Amélia, Francisco José de Medeiros, sempre fiel aos seus princípios, entendeu pedir a demissão, abandonando o Ministério nos finais de Outubro de 1909 e sendo substituído na pasta da Justiça pelo Conselheiro Artur Pinto de Miranda Montenegro" Louvando o trabalho histórico desda página da web, despeço-me coridalmente.
    Luís Fernandes (deixo o meu cantacto luis_costa8@hotmail.com)

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  2. Caro Luís Fernandes:
    A principal fonte de onde recolhi a referidas informações relativamente à portaria que teria dado lugar ao diferendo da "questão do Bispo de Beja" foi uma publicação local, respigada de outras mais conhecidas que passo a enunciar:

    VELOSO, A. Martins, Valpaços, Monografia, Lello & Irmão, 2.ª Ed. Porto, 1990, pp. 128-131.

    respigada em:

    Fortunato de Almeida, História de Portugal.
    Gama Barros, História da Administraçãp Pública Portuguesa.

    Existem outras fontes digitais onde se pode aceder a algumas sinopses sobre o mesmo tema, designadamente através dos seguintes url:

    -Do Instituto Superior de Ciênciass Sociais e Políticas / Centro de Estudos do Pensamento Político, Governo de Wenceslau de Lima... |url: http://www.iscsp.utl.pt/~cepp/governos_portugueses/1900-1910/wenceslau_de_lima.htm

    Outros:

    Site de José Adelino Maltês | url: http://maltez.info/respublica/Cepp/governos_portugueses/1900-1910/wenceslau_de_lima.htm

    Bem como em outros sites, como é o caso da Fundação Mário Soares com a entrada "Conflito entre o Bispo de Beja e o Ministro da Justiça.

    E é que me ocorre agora, até ver, para que lhe possa valer,Sr. Luís Fernandes.

    Desejando-lhe os melhores resultados com o seu trabalho e, já agora, um Feliz Natal de 2011,
    Os meus cordiais cumprimentos,

    Leonel Salvado.

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