Por Leonel Salvado
1. ADMINISTRAÇÃO
1.1. O
concelho de Valpaços
O Concelho de Valpaços é o resultado de
um contínuo processo de reformas administrativas da época liberal no país,
inspiradas nas reformas que já haviam sido preconizadas por Mouzinho da
Silveira, apontadas no mesmo sentido democrático e descentralizador da
administração pública e implementadas também na antiga Província de
Trás-os-Montes que passou nos meados do século XIX a ser integrado pelos
distritos administrativos de Vila Real, de que faz parte, e de Bragança.
O processo acima referido foi gradual,
mas foram precisos apenas 62 anos para que o concelho adquirisse a estrutura
que ainda hoje mantém.
Foi por Decreto de 6 de Novembro de
1836, emanado do ministério setembrista de Manuel da Silva Passos (Passos
Manuel), que a então aldeia de Valpaços se viu elevada a sede de concelho constituído
pela freguesia com o mesmo nome, sob a designação de freguesia de Santa Maria
de Valpaços, e as localidades anexas de Lagoas, Valverde e Vale de Casas.
Após um novo código administrativo
promulgado pelo mesmo Ministro, em 31 de Dezembro desse mesmo ano de 1836,
abriram-se claras perspectivas para um futuro engrandecimento da história do
municipalismo valpacense.
Com efeito, logo em 27 de Setembro de
1837, por carta de lei, eram integradas no concelho de Valpaços as freguesias
de Santiago da Ribeira de Alhariz, Ervões, Friões, Lilela, Possacos, Rio Torto,
Sanfins Vassal e Vilarandelo, que pertenciam ao termo de Chaves, bem como a de
Argeriz, retirada do termo de Carrazedo de Montenegro, e Fornos do Pinhal, ao
de Monforte de Rio Livre.
Dezasseis anos depois, o Decreto de 31
de Dezembro de 1853 extinguia os concelhos de Carrazedo de Montenegro e Monforte
de Rio Livre e determinava a transferência das freguesias dos respectivos
termos, no todo e em parte, respectivamente, para o concelho e comarca (que o
mesmo diploma instituía) de Valpaços.
Divisões administrativas no actual Distrito de Vila Real
1840 – 1860
(clique sobre a área dos mapas para os aumentar)
FONTE: Mapas – Fernando de Sousa, “População e economia do distrito de Vila Real em meados do século XIX”
in “ESTUDOS TRANSMONTANOS”, BPAD,
Biblioteca Pública e Arquivo Distrital de Vila Real, N.º1, 1983, pp. 16 e 17
De Monforte passaram para Valpaços as
freguesias de Alvarelhos, Barreiros, Bouçoais, Fiães (inicialmente integrada no
concelho de Chaves e passada ao de Valpaços a 24 de Outubro de 1855), Nozelos,
Santa Valha, Sonim, Tinhela e Lebução, sendo de notar que era a localidade de
Lebução que, desde 1836 vinha substituindo a Vila de Monforte do Rio Livre, à
cabeça do concelho desta que, prevalecendo porém a mesma designação fosse por
força do costume ou por respeito à antiguidade da praça-forte.
Do concelho de Carrazedo de Montenegro,
passaram ao de Valpaços, além da própria sede, agora extinta, as freguesias de
Água Revés (concelho extinto pelo mesmo decreto de 31 de Dezembro de 1836),
Canaveses, Padrela e Tazém, Santa Maria de Émeres, São João de Corveira, São
Pedro de Veiga do Lila, Serapicos, Jou, Curros e Vales.
Em 1896 Jou, Curros e Vales foram
anexadas a Murça, em resultado de uma jogada política do candidato regenerador
à eleição pelo círculo de Alijó, Teixeira de Sousa, mas dois anos depois, sob o
governo do Partido Progressista de Luciano de Castro, as duas últimas
freguesias são reintegradas no concelho de Valpaços.
Com tão vasto termo municipal, Valpaços
foi elevado à categoria de Vila, com o nome de Valpassos, por Decreto Real de D. Pedro V, datado de 27 de Março de
1861. Finalmente, no dia 13 de Maio de 1999 foi a Vila elevada à categoria de
Cidade.
Como se poderá concluir do exposto, anteriormente
ao dia 6 de Novembro de 1836, efusivamente comemorado todos os anos pela
Autarquia de Valpaços, a situação administrativa das terras que a compõem -
típica do Antigo Regime -, era bastante diferente!
1.2. DIVISÃO ADMINISTRATIVA CIVIL - DOS MEADOS DO SÉCULO XVIII À 1.ª METADE DO SÉCULO XIX
Em 1758 as freguesias que compõem o actual concelho de Valpaços, no
distrito de Vila Real, encontravam-se distribuídos pelos concelhos de Chaves,
Monforte de Rio Livre e Água Revés, tendo sido, este, concelho sobre si com
jurisdição donatarial da Casa de Murça. Este último concelho, cujo senhorio
pertenceu Luís Guedes de Miranda, acabou por cair em posse da Coroa por falecimento daquele último administrador da antiga Casa de Murça em 29 de
Fevereiro de 1758 e por falta de sucessão legítima, juntamente com os restantes
domínios da mesma Casa. Por essa razão entendi não levá-lo em conta nas
representações cartográficas relativas à evolução da divisão territorial por
concelhos que a seguir exponho. Convém contudo observar, como o fez e muito bem
A. Veloso Martins na Monografia de Valpaços, que se manteve como Vila e sede de
concelho até à sua extinção em 6 de Novembro de 1836, pelo mesmo Decreto que instituiu
o concelho de Valpaços, passando entretanto para o Concelho de Carrazedo de
Montenegro até 31 de Dezembro 1853, data do Decreto em que se determinou também
a extinção deste.
Divisão administrativa nos meados do século XVIII
FONTES:
1 - Mapa – Id. Ibid. p. 16. (adaptado)
2 - Leonel Salvado, “O concelho de
Valpaços nas Memórias Paroquiais de 1758”, in “Clube de História de Valpaços”
http://clubehistoriaesvalp.blogspot.pt/
Distribuição das freguesias do actual concelho de Valpaços
1758
(clique sobre a tabela para a aumentar)
1758
(clique sobre a tabela para a aumentar)
FONTE: Leonel Salvado, Ibid.
Pelos inícios do século XIX esta divisão administrativa assim
compreendida sofreria novas alterações. Restaurado o concelho de Carrazedo de
Montenegro que fora criado por carta de foral de D. Dinis em 1301, e sendo-lhe renovada
a categoria de Vila e de cabeça de julgado, ainda que continuando sujeito à
comarca de Chaves, Carrazedo de Montenegro compôs o seu termo com a recuperação
das antigas “terras de Montenegro” que haviam sido agregadas aos concelhos de
Chaves, Vila Pouca de Aguiar e Murça. E entre elas encontravam-se algumas
freguesias que hoje pertencem ao concelho de Valpaços.
As paróquias de Nossa Senhora da Expectação de Crasto, São Lourenço de
Lilela, São Salvador de Nozedo, Nossa Senhora da Assunção de Tazém e São
Lourenço de Vilartão constituíam freguesias independentes até às reformas administrativas
liberais do século XIX empreendidas em 1837 e em 1853 por força das quais foram
anexadas às freguesias de Água Revés e Crasto, Rio Torto, São João da Corveira,
Padrela e Tazém e Bouçoais, respectivamente, assim como se encontram hoje.
Divisão administrativa na 1.ª metade do século XIX
FONTES:
1 - Mapa – Fernando de Sousa. Ibid. p. 16. (adaptado)
2 - Leonel Salvado, Ibid.
* Carta de Lei de 27 de Setembro de 1837
** Decreto de 31 de Dezembro de 1853
Distribuição das freguesias do actual concelho de Valpaços
c. 1820 – 1837*(1853**)
(clique sobre a tabela para a aumentar)
(clique sobre a tabela para a aumentar)
FONTES: Leonel Salvado, Ibid.
* Carta de Lei de 27 de Setembro de 1837
** Decreto de 31 de Dezembro de 1853
(clique sobre a área dos gráficos para os aumentar)
1.3 ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA ECLESIÁSTICA NOS MEADOS DO SÉCULO XVIII
José Viriato Capela, no
seu trabalho “As freguesias do Distrito
de Vila Real nas Memórias Paroquiais de 1758, Memórias, História e Património”,
refere a importância que no quadro territorial e social das comunidades rurais
do Antigo Regime se revestiam a aldeia
ou o lugar, enquanto células da vida social
e agrária por excelência.
Simultaneamente, ao longo
dos tempos, entre os séculos XV a XVIIII, a paróquia afirmava-se como “a
principal instituição de organização sócio-política das comunidades locais
portuguesas”. Por esse tempo a maior parte das comunidades do actual distrito
de Vila Real pertencia ao Arcebispado de
Braga. Porém no seu quadrante setentrional as paróquias que hoje compõem os
concelhos de Chaves e Valpaços passaram a repartir-se entre aquela arquidiocese
e a diocese de Miranda do Douro desde a criação desta a 23 de Março de 1535. Nos
meados do século XVIII, as freguesias da diocese bracarense nesta mesma área
transmontana enquadravam-se na comarca de Chaves (que eram também do termo
desta Vila) ao passo que as que transitaram para a diocese de Miranda do Douro
(do termo da Vila de Monforte de Rio Livre) pertenciam à comarca de Moncorvo.
Articuladas com a
paróquia, ao longo do mesmo período, encontravam-se a Coroa e a Ordem
Senhorial, através do município e da ordem municipal. Os municípios apenas
intermediavam a Coroa e a Ordem Senhorial na implementação dos meios para
garantir o seu poder económico e os seus meios financeiros e a ordem e poder
público régios – a fiscalidade e a estruturação de serviços de justiça saúde e
defesa. Esta relação de poderes que as câmaras estabeleciam com as comunidades
e que na expressão do mesmo autor, José Viriato Capela, era “uma relação politico – fiscal – senhorial –
rentista, que decorria de uma dinâmica senhorial e individualista”, foi em
grande parte também, uma realidade nas freguesias que actualmente fazem parte
do concelho de Valpaços, o que se vê pelas respostas de uma variedade de
párocos memorialistas aos Inquéritos paroquiais de 1758. Assim, com base nas
informações dos mesmos párocos constata-se que as jurisdições comarcãs e
concelhias de algumas destas freguesias estiveram, em maior ou menor
dependência, em poder dos respectivos donatários, como os condes de Atouguia a quem,
entre outras jurisdições, asseguraram as do concelho de Monforte de Rio Livre,
ao passo que o concelho de Chaves pertencia directamente à Casa de Bragança e o
de Água Revés à Casa de Murça, como atrás referi. Tal situação tinha evidentes
repercussões no exercício da justiça e nas categorias das magistraturas. Apesar
de nos meados do século XVIII surgirem referências a juízes eleitos nas
freguesias, juízes de vintena ou juízes pedanios (“espadanios” era a expressão corrente) e quadrilheiros, que podem ser entendidos como sinais de relativa
autonomia nas comunidades paroquiais, nas freguesias cujas jurisdições pertenciam
à Coroa e os respectivos párocos nunca deixaram de realçar, aludindo à
“Sereníssima Casa de Bragança”, era mais comum elas estarem sujeitas ao Juiz de Fora, de nomeação régia (como
sucedia nas freguesias do concelho de Chaves), ao passo que naquelas em que a
jurisdição ainda cabia, por direito, às referidas Casas Senhorias, os donatários, predominavam os Juízes ordinários, eleitos anualmente pelos
povos e câmaras sob anuência dos respectivos Senhores, obrigados a residir nas
respectivas comarcas ou nos concelhos onde exerciam, em acção conjunta ou “sujeita aos ministros da cabeça de comarca”
(Memórias Paroquiais, Barreiros, 1758, Valpaços) e podendo ser acompanhados de
outros magistrados, conforme os casos (como sucedia nas freguesias do termo de
Monforte de Rio Livre, da Casa de Atouguia). Mas só a partir da segunda metade
do século XVIII, sob o Estado Pombalino, é que esta relação de poderes começou
a ser progressivamente desmantelada com vista ao estabelecimento de uma relação
mais directa do Estado com os povos.
Cumpre ainda referir, neste
mesmo contexto das relações de poder da organização administrativa dos meados
do século XVIII no espaço do actual concelho de Valpaços, a existência de
algumas abadias ou benefícios eclesiásticos nem sempre conformes com os limites
definidos pela divisão administrativa civil, o que logo se verifica pela variedade
dos títulos dos respectivos párocos – reitores,
abades, vigários e curas.
Organização administrativa e eclesiástica no território do actual concelho de Valpaços
1758
1758
(clique sobre a tabela para a aumentar)
Fonte: Leonel Salvado, Ibid.
Distribuição dos títulos paroquiais
(valores percentuais dos titulares e das freguesias)
1758
(clique sobre a área dos gráficos para os aumentar)
(clique sobre a área dos gráficos para os aumentar)
Fonte: Leonel Salvado, Ibid.
Jurisdições senhoriais
(Coroa e donatários/comendadores)
1758
(clique sobre o gráfico para o aumentar)
(clique sobre o gráfico para o aumentar)
Excelente trabalho de pesquisa sobre a formação do nosso Concelho de Valpaços. Já o conhecia, mas não tão pormenorizado como está este.
ResponderEliminarAmílcar Rôlo
(Valpaços)
Como sempre, Muito Obrigado amigo Amílcar Rôlo. O próximo passo será a População, para a mesma época. As fontes são escassas mas... a ver vamos!
ResponderEliminarUm Abraço amigo,
Leonel Salvado