sexta-feira, 5 de agosto de 2011

DOCUMENTOS: Concelho de Valpaços – A vila de Carrazedo de Montenegro e outras freguesias do concelho de Valpaços que foram do termo de Chaves

Por Leonel Salvado

Nota Prévia: Antes das grandes reformas administrativas da era liberal em Portugal os centros da organização municipal não tinham necessariamente que receber o qualificativo de Villa. Carrazedo de Montenegro, por exemplo, constitui um dos casos muito pouco esclarecidos no sentido de que tenha sido sede de concelho até, como consta em muitas monografias, à sua, documentada, extinção municipal em consequência da reforma administrativa, em 1853. Na verdade, segundo fontes incontestáveis como é o caso da “Corografia Portuguesa e descipçam topográfica do famoso reyno de Portugal…” composto e começado a publicar em 1706, “São Nicolao de Carrazedo” era, à época, mencionada como apenas uma das demais freguesias do termo de Chaves. Não duvidamos da sua remota fundação paroquial medieval nem da, documentada asserção de que tenha recebido um primeiro foral de D. Dinis em 1301, com a designação de ”Villa Boa de Montenegro”, pela qual se obrigava à renda anual de 3 000 libras, seguido de um outro em 1303 em que essa obrigação se desdobrava em duas prestações, e que, desde então, e durante a subsequente idade medieval tenha ocupado um importante papel político-administrativo e de tutela eclesiástica sobre as demais terras de Montenegro. Quanto à existência de um novo foral no século XVII, que se diz ter sucedido em razão dos interesses do Senhorio da Casa de Bragança, no qual de integrava, pouco ou nenhuma importância deve ter exercido na reabilitação da importância que Carrazedo de Montenegro deve ter tido nos finais da época medieval se não apenas no domínio da jurisdição eclesiástica, pois como também se deduz das informações do Padre António Carvalho da Costa, a freguesia de S. Nicolau de Carrazedo seria no início do século XVIII reitorado da mitra do arcebispo de Braga e comenda da Ordem de Cristo do qual eram curados anexos algumas freguesias do mesmo termo de Chaves. A sua reafirmação na tutela municipal das terras que hoje compõem o concelho de Valpaços desde 1853 deve ter ocorrido após os meados do século XVIII, pois tanto pelo que se extrai da descrição do Padre Carvalho da Costa, redigida cerca de 106, como do que se lê no primeiro volume do Dicionário Geográfico do Padre Luiz Cardoso que escapou ao Terramoto de 1755, Carrazedo de Montenegro era uma sombra do que havia certamente sido no passado e, portanto, essa reafirmação teria durado apenas cerca de mais um século até à mencionada extinção do seu concelho em 1853. Nem sequer surge na documentação setecentista a designação de “Villa” em relação a Carrazedo de Montenegro. A sua reelevação a sede concelho parece ter sido um produto das primeiras reformas administrativas liberais, como depreendemos do que se diz no site “Valpaços no sapo.pt” que «foi a falta de pagamentos da renda estipulada [nos seus primeiros forais de 1301-1303] que levou a que passasse a integrar o concelho de Chaves» e que «saldou-se em conflitos que fariam com que em finais do século XVII as terras de Montenegro voltassem a ter […] o seu concelho restaurado, promovida a Vila em 1820 e a cabeça de julgado na comarca de Chaves». Se em relação à reelevação de Carrazedo de Motenegro a Vila na primeira das datas mencionadas já apresentei as minhas dúvidas, parece-me aceitável, em face da documentação posterior, que a segunda asserção esteja correcta: Uma efeméride favorecida pelo regime liberal que, paradoxalmente haveria, de estar na origem da extinção do concelho de Carrazedo de Montenegro em favor da criação do concelho de Valpaços. Parece-me relevante, por conseguinte, considerar Carrazedo de Montenegro como uma localidade do concelho de Valpaços que também foi vila na Idade Média, deixou de o ser, voltou a sê-lo nos primórdios da época liberal em Portugal, perdeu de novo essa categoria e tornou a reavê-la por determinação da Assembleia da República, a 18 de Julho de 1990. Enfim, uma povoação que merece destaque entre as freguesias do concelho de Valpaços que foram durante séculos freguesias do termo de Chaves.

“COROGRAFIA e desrcipçam topográfica do famoso reyno de Portugal…” do Padre António Carvalho da costa.
 (1706 – 1712)
TRATADO III – Da Comarca & Ouvidoria de Bragança
TOMO I
CAP. V [pp. 506 – 511]
[conforme o original]

Da Villa de Chaves
He esta Villa do Arecebispado de Braga, & do Estado da Casa de Bragança, em que entre o seu Ouvidor em Correiçaõ, & o Provedor da Comarca de Guimaraens a exercitar seu officio […].
Reside nesta Villa hum Auditor Geral, que conhece das causas dos Soldados, & há hum Vigario Geral posto pelo Arcebispo de Braga com certa jurisdiçaõ coarctada nesta Villa, & em outras circunvisinhas. Assistem ao seu governo civil hum Juiz de Fóra, Vereadores com seus Officiaes, hum Juiz dos Orfãos com dous Escryvaens, & seis Tabeliaens. Tem muitas casas nobres de appellidos, Magalhaens, Teixeiras, Barros, Bahias, Queirogas, Madeiras, Pinheiros, Fontouras, Moraes, Araujos, Fontes, Oliveiras, Carneiros, Campilhos, Pereiras, Velhos, Barrozos, Sousas, Costas, Pessoas, Brandoens, Chaves, Pequenos, & outros muitos.

Lugares do termo desta Villa, que se dividem pelas Freguesias seguintes.
[…]
S. Vicente de Vilharandello tem cento & cincoenta & dous visinhos, & huma Ermida: he Vigairaria de Malta da Commenda de Saõ Joaõ da Corveira.
S. Joaõ, Vigairaria de Malta da mesma Commenda, tem estes lugares, Ervvões com cincoenta visinhos, Lamas com dezaseis, Alpande com vinte & cinco, Valongo com oito, Villardouro com seis, Alfonge com doze, Sendocelhe cõ dez, & Sa com cincoente & cinco, & huma Ermida de Santa Luzia.
Santa Maria de Vaçal, Curado da apresentação do Cabido de Braga, tem Vaçal com cincoenta visinhos, & Monçalvarga com quarenta.
S. Pedro de Frioes, Vigairaria da apresnetação da Casa de Bragança, que rende duzentos mil reis; tem estes lugares, Frioens com seis visinhos, Villarinho com vinte & dous, Frugende com dezanove, Quintella com cincoenta, S. Domingos com seis, Ladairo com dez, Selleirós com cincoenta, Villaranda boa com doze, Paranhos com dezoito, & Mosteiro de cima com vinte & seis: os dízimos desta Freguesia saõ do Prior de Chaves.
S. Mamede, Curado annexo à Reytoria de S. Nicolao de Carrazedos, tem Argeris com oitenta visinhos, Ribas com vinte & cinco, Pereiro de Santiago com vinte, Alvarenta com quinze, Midoens com dez, & Valdespinho com oito.
S. Pedro de Sanfins, Curado annexo à mesma Reytoria de Carrazedo, tem quarenta vizinhos.
Santa Maria de Crasto, Curado annexo à mesma Reytoria de Crasto, tem quarenta visinhos.
S. Pedro do Rio torto, Reytoria, & Commenda de Christo,( de que he Commendador o Conde de S. Lourenço) tem noventa visinhos.
S. Lourenço de Lilella, Curado annexo à Reytoria de Saõ Pedro de Rio torto, tem Lillela com vinte & seis visinhos, Povoa com vinte & dous, Payo com doze.
Nossa Senhora das Neves da Veiga de Lila tem trinta & dous visinhos: he annexa à Reytoria de S. Pedro dos Valles.
S. Pedro dos Valles*, Reytoria da apresentaçaõ da Casa de Bragança, que com as suas annexas rende ao Reytor duzentos mil reis, tem quarenta visinhos, & huma Commenda que apresenta a Casa de Bragança, que renderá trezentos mil reis.
Nossa Senhora do O, he annexa à Reytoria de S. Pedro dos Valles: tem estes lugares, Canavezes com quarenta visinhos, Cadouso com vinte, Deimáos com trinta, & Emeres com oito.
S. Nicolao dos Valles, Reytoria da Mitra, & Commenda de Christo (de que he Commendador Francisco Teixeira Chaves) tem Vallos com vinte & dous visinhos, & Zebres com dezaseis.
Santo André tem Jou* com sessenta & cinco visinhos, Toubres com dezoito, Valdigua com oito, Cima da Villa com quarenta & cinco: he annexa à Reytoria de S. Pedro dos Valles.
S. Miguel, Curado annexo à Reytoria de S. Nicolao de Carrazedo, tem Curros com vinte & cinco visinhos, Val do Campo com doze, & Cabanas com onze.
Santa Maria de Emeres, Curado annexo à mesma Reytoria de Carrazedo, tem setenta visinhos.
S. Nicolao de Carrazedo, Reytoria da Mitra, & Commenda de Christo (de que he Commendador o Marquez da Fronteira) tem Carrazedo com noventa vizinhos, Silva com vinte & seis, Cubo, & Ribeira da Fraga com trinta.
Santa Maria de Tazem, Curado annexo à Reytoria de Carrazedo, tem o lugar de Tazem com trinta visinhos, Valizellos com doze, Cubas com nove, & Frutuoso com quinze
S Joaõ da Corveira, Vigairaria de Malta, tem S. Joaõ da Corveira com dezoito visinhos, Corveira com doze, Junqueira com quatorze, Rio bom com vinte & dous, Sobrado da Junqueira com dezanove, Busto com nove, Varges, & Quintelinha com oito, & Vilarinho do Monte com dezoito.
S. Salvador de Nuzedo he annexa à Reytoria de Santa Leucadia: tem Nuzedo com quarenta visinhos, & Argemil com quarenta&e cinco; rende a Reytoria de Santa Leucadia com as suas annexas cem mil reis, & tem huma Commenda da Casa de Bragança, que rende quatrocentos mil reis.
S. Pedro de Padrela, Curado anexo à Reytoria de Carrazedo, tem trinta visinhos.[…]
Santa Ana de Serapicos, Curado da apresentação do Cabido de Braga, tem trinta & seis visinhos.
Santiago, Vigairaria do mesmo Cabido, tem estes lugares, Santiago da Ribeira com quatro vizinhos, Alvites e Dagoy com desaseis, Campo degoa com cinquenta,Cancello com oito, Esturãos com dezanone, Paredella de S. Juzenda com vinte, Parada de S. Juzenda com treze, S. Cibraõ com doze, Villela do Monte com quatorze, & Villa-nova do Monte com dezaseis.
Santa Maria, Vigairaria do mesmo Cabido, tem Valpassos com cento & sessenta visinhos, Lagoas com vinte & dous, Valverde com doze, & Val de Casas com trinta.
Santa Maria de Possaquos, Vigairaria do mesmo Cabido, tem Possaquos com cem visinhos, & Cachão com vinte.

[Termina o Cap. V]

*Em 1896 Jou, Curros e Vales foram anexadas ao concelho Murça, em resultado de uma jogada política do candidato regenerador à eleição pelo círculo de Alijó, Teixeira de Sousa, mas dois anos depois, sob o governo do Partido Progressista de Luciano de Castro, as duas últimas freguesias são reintegradas no concelho de Valpaços.

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