quinta-feira, 8 de abril de 2010

D. Afonso Henriques, um rei polémico

D. Afonso Henriques, o nosso primeiro rei, foi transformado pelos historiadores numa das figuras polémicas da História de Portugal. Não se trata da batalha de Ourique ou de qualquer dos seus feitos, nem da sua origem genética ou das suas qualidades físicas e morais, que também já chegaram a ser postas em causa! Desta vez a questão central da polémica é a do local e data do seu nascimento. Para uns, isto é, para os mentores da visão tradicional, que é o que ainda consta nos manuais escolares, ele nasceu em Guimarães no ano de 1111. Para outros, entre os quais se destacam alguns medievalistas consagrados do país, credibilizou-se uma nova tese, que já tem perto de vinte anos: A de que, afinal, ele nasceu Viseu em Agosto de 1109. Em 2008 a polémica reacendeu-se, e neste ano os Municípios de Viseu e de Guimarães comemoraram as datas respectivas, reclamando, cada uma das cidades, a categoria de cidade-berço da Nacionalidade.

Deixamos aos nossos leitores a liberdade de ajuizarem do sentido de cada uma das interpretações envolvidas neste diferendo, a partir das notícias veiculadas por dois meios de comunicação relacionados com cada uma das cidades mencionadas.

I

“Afonso Henriques: um Rei polémico” é o título do mais recente livro de João Barroso da Fonte. A publicação, constituída por cerca de 300 páginas e escrita em cerca de mês e meio, foi apresentada, na passada sexta-feira, no restaurante “Vira-Bar”, entre amigos. O autor de várias monografias, entre as quais “ O Paço dos Duques de Bragança”, “Castelo de Guimarães”, “Capela de S. Miguel do Castelo”, “Afonso Henriques – Português de Guimarães” e “Mumadona – a fundadora de Guimarães” explica, no preâmbulo deste livro, as razões que o levaram, como afirmou no lançamento do mesmo, a “escrever este livro com grande entusiasmo para ver se ainda salvamos o que temos de mais sagrado”. E o mais sagrado para o autor é defender a tese que D. Afonso Henriques terá nascido, “conforme a tradição”, em 1111, em Guimarães, e não em 1109 e em Viseu, conforme sustenta o historiador de Tarouca, A. de Almeida Fernandes que iniciou a defesa da chamada tese de Viseu, no início dos anos 90. Impedir que esta data – 1109 – seja legitimada oficialmente como os 900 anos do nascimento de D. Afonso Henriques é o objectivo de Barroso da Fonte que, à semelhança do que tem vindo a fazer nas suas crónicas no NG, apresentou vários argumentos para “defender a tradição”. Começando por citar Manuela Mendonça, presidente da Academia de História disse: “a mais alta figura científica dessa área disse-me, abertamente:‘eu aprendi e sempre ensinei que Afonso Henriques nasceu, em Guimarães, em 1111. Em 1109 nunca ouvi falar, frisou o autor de “D. Afonso Henriques – um rei polémico” que logo passou à polémica com os argumentos de Almeida Fernandes, questionando: “como é que a partir de uma referência de 2 a 3 anos do nascimento antes da morte do pai, vamos construir o dia, o mês e o ano, como se fosse uma fórmula matemática? É que segundo Barroso da Fonte, “o Dr. Almeida Fernandes tem uma infelicidade neste tema. É que ele constrói a data do nascimento de Afonso Henriques a partir da morte do pai, a 1 de Maio de 1112, na Batalha de Astorga. E este é o ponto de partida. Mas não se sabe se o Conde D. Henrique morreu no ano de 1112 ou 1114”, frisou. Para além disso “como as crónicas dizem que Afonso Henriques tinha 2 a 3 anos quando o pai morreu, interessou-lhe que o nascimento fosse em Agosto. Isto porque encontrou num livro – onde se diz que D. Teresa estaria em Viseu, impedida fisicamente de acompanhar o marido a visitar o pai – a escritura do Mosteiro de Lorvão, assinada em Viseu, em 5 de Agosto de 1109. Então afirma no livro “Pai da Pátria” que Afonso Henriques nasceu 6 de Agosto de 1109!”, criticou. Sendo certo, que “não há nenhuma prova, em lado nenhum, que sustente a presença de D. Teresa na assinatura desta escritura”, que “não há qualquer certidão quando à data e ao local do nascimento de D. Afonso Henriques e ainda que “é facto assente que entre 1094 e 1113 todas as datas têm defensores credenciados”, Barroso da Fonte – que integra neste livro o contributo de vários autores e muita bibliografia – elege como principais argumentos para a tese do nascimento a 1111, em Guimarães, o facto de ter existirem em Guimarães todas as infra-estruturas necessárias para ter sido o berço da nacionalidade de que são exemplo o castelo, a capela de S. Miguel e o antigo mosteiro, sede fundação por Mumadona, onde está hoje a Colegiada da Oliveira, local que Barroso da Fonte alega ter sido o berço mais provável de D. Afonso Henriques.

Sara Machado Oliveira, 25 Junho 2009, in http://www.noticiasdeguimaraes.com


II

O berço de nascimento do primeiro Rei de Portugal tem sido um ponto de debate entre historiadores e especialistas. Desde sempre que a nacionalidade de D. Afonso Henriques esteve associada à cidade de Guimarães, que durante este ano também comemorou o seu nascimento à semelhança de Viseu que ao longo do ano promoveu um conjunto de iniciativas comemorativas. As duas cidades apresentam 'pareceres' históricos e documentos que tentam provar o local onde, efectivamente, nasceu o 1º Rei de Portugal. A polémica tese "Viseu, Agosto de 1109, nasce D. Afonso Henriques", do historiador Armando de Almeida Fernandes, foi publicada pela primeira vez na revista Beira Alta, depois em livro pelo Governo Civil de Viseu (1993), tendo este sido reeditado em 2007 pela Fundação Mariana Seixas, da mesma cidade. A partir da reedição do livro em 2007 voltou a surgir o debate e, desta vez, no meio académico. Hoje existe um conjunto de medievalistas reputadíssimos a subscrever a tese. Entre eles Bernardo Vasconcellos e Sousa, professor catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa, que considerou que "com base em informações indirectas sobre o paradeiro dos pais do monarca, creio que a hipótese de Viseu é a mais provável". "Viseu é, quase, com muita probabilidade a terra de nascimento de D. Afonso Henriques", defendeu também António Borges Coelho, professor jubilado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Numa carta enviada a Almeida Fernandes, em 1992, e que só recentemente foi descoberta, o cónego Avelino de Jesus da Costa, que era professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra escreveu: "Quanto ao nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu, os documentos apresentados por V.ª Ex.ª não permitem outra conclusão"."Os 900 anos foram celebrados este ano pelas duas cidades e ambas as autarquias estão de parabéns pela forma como encaminharam e lidaram com esta polémica", concluiu o historiador Júlio Cruz, lembrando que é preciso "manter viva a investigação".

in Diário de Viseu, edição de 18 de Novembro de 2009, http://www.diarioviseu.pt

Imagem ilustrativa: http://gladio.blogspot.com/2008_07_01_archive.html

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