Por Leonel Salvado
Nota prévia: Lilela, hoje uma pequena aldeia anexa à freguesia de Rio Torto, já foi sede de antiga freguesia e assim se mantinha em 1758, como o atesta o respectivo pároco memorialista, então vigário apresentado pelo Reitor de S. Pedro de Rio Torto. Por essa razão entendi só agora apresentar aqui o documento das “Memórias Paroquiais” que lhe diz respeito, a seguir ao daquela freguesia, recentemente publicado, em detrimento da conveniente ordem alfabética estabelecida, como aliás já aconteceu noutros casos.
MEMÓRIAS PAROQUIAIS, 1758, Tomo 20, LILELA, Chaves
[Cota actual: Memórias paroquiais, vol. 20 n.º 86, p. 649 a 654]
Digo que é da Província de Trás-o-Montes, Arcebispado de Braga, termo da Vila de Chaves, da Comarca de Chaves, freguesia de São Lourenço de Lilela.
É d’el Rei Nosso Senhor, que Deus guarde, esta terra. Quanto ao que pertence aos frutos da renda é Comenda do Senhor Conde de São Lourenço. A igreja é dada ou apresentada pelo Reitor de Rio Torto.
Quanto aos vizinhos, tem setenta vizinhos esta freguesia e pessoas tem cento e oitenta, excepto os meninos.
Quanto ao sítio, está posta esta igreja em um baixo cujo lugar se chama Lilela e passa uma ribeira pelo meio do povo e não se descobre dele outro lugar.
A igreja fica dentro do lugar de Lilela e a esta freguesia pertence um lugar chamado a Póvoa e também pertence a esta freguesia a quinta de Leirós que tem dois moradores nela. O orago é São Lourenço. Na Paróquia estão três Altares, o maior de São Lourenço, o colateral da mão direita é da Senhora do Rosário e o da mão esquerda de Santo António. O pároco é vigário ad nutum de São Pedro de Rio Torto e tem de renda quinze mil e seiscentos réis, trinta e dois alqueires de trigo, trinta e dois almudes de vinho, digo poderá chegar a sessenta ou setenta mil réis todo o rendimento dela e muitos anos não chega a eles.
Neste lugar de Lilela há uma ermida de Nossa Senhora dos Milagres junto do povo e fora dele; pertence à freguesia. E no lugar da Póvoa está a capela de São Sebastião; pertence aos moradores do dito lugar e fica fora do povo. E na quinta de Leirós, desta freguesia, se acha a capela da Senhora da Conceição; pertence esta a uns morgados, cavaleiros de Bragança, chamados os Malangas. Somente a São Lourenço de Lilela acode romagem, aos dez de Agosto, e é orago desta freguesia.
Os frutos da terra são azeite bastante, mas vendidos a homens de fora, centeio, algum trigo e feijões e também algum vinho.
Aqui estão sujeitos à justiça de Chaves que há juiz de fora desta Vila. Quanto ao correio aqui se servem do de Chaves que fica distante cinco léguas.
Dista esta freguesia de Braga, que é cabeça, dezoito léguas e de Lisboa [? - costura apertada]. Não tem muros, nem castelo, nem torres. Não padeceu nada do terramoto [de 1755].
O que se procura a respeito desta Serra.
Há uma serra chamada a serra de Santa Comba por estar nele Santa Comba, que é de outra freguesia e pega com o termo do lugar de Póvoa desta freguesia; por outro nome lhe chamam a serra do Rei de Orelhão. Tem duas léguas de comprimento e légua e meia de largura. Principia no termo do lugar da Póvoa, desta freguesia, e se acaba, o mais à frente, no distrito de Franco, porém dizem que vai continuando até junto de Passos. O principal braço dela chama-se Santa Comba. Nela somente nasce um regato chamado Cabreiro que não tem propriedades naturais; corre de poente para nascente e se mete no rio chamado Tua.
Na serra não há lugar nenhum. Fica ao pé dela um lugar chamado a Póvoa, desta freguesia. Fica Rio Torto entre Norte e Nascente; fica Suçães ao nascente; fica S. Pedro de Veiga de Lila ao Norte; fica a freguesia de Vales a poente; fica a Vila chamada Lamas de Orelhão e um lugar chamado Franco do Sul.
Não se acha alguma fonte de propriedades [raras] nela. Somente consta que tenha sorgos, carvalhos e giestas; não tem nela ervas de medicina.
Na dita serra há Santa Comba e São Leonardo, cada um com sua capela, mas juntas. Costuma haver romagem à de Santa Comba no dia de São Silvestre, no dia último de Setembro e no dia dez de Agosto, aonde sucede haver algumas bulhas e discórdias. Esta capela é da freguesia de São Nicolau dos Vales.
Quanto ao temperamento é fria bastante e costuma carregar-se de neve e gelo no Inverno.
Nesta serra se criam muitos lobos, porcos monteiros, coelhos e perdizes, algumas, e nada mais que raposas. Não sei se tenha lagoa, só sim alguns fojos medonhos e também um poço de caçar lobos e porcos monteiros. E nada mais digno de reparo.
O que se procura a respeito do rio.
Por este povo de Lilela passa uma ribeira de água e não tem nome próprio. Começa no termo do lugar de Jou e passa por dentro do lugar de Veiga de Lila e por Canaveses e se mete em um rio maior no fim do termo deste povo. Alguns anos seca pelo tempo do Verão.
No que respeita ao rio se chama Rabaçal que principia em Galiza e corre para o Douro. Não é de navegações. Tem algumas represas de moinhos e azenhas e tem o curso arrebatado em certas partes. Corre de Norte a Sul. Cria peixes de castas pequenas.
Tanto o rio como a ribeira não têm pescarias certas, mas sim de quem quer caçar. Têm algum arvoredo mas pouco. É cultivado de caminhos. Perde o nome quando passa pelo termo de Miradeses, o do rio, e se chama de rio Tua e vai dividindo entre o Bispado de Miranda e de Braga e passa dividindo entre o termo da Vila de Chaves e o de Mirandela. Tem duas cachoeiras e passa por um lugar chamado o Cachão e junto dele tem uma ponte no lugar de Vale de Telhas, em Mirandela, toda de pedra. Não sei que tenha lagar de azeite, nem pisão. Não sei de que nele se tirasse ouro. Os povos usam livremente de suas águas. Terá, quando passa pelo termo de Lilela mais de dez léguas. Quanto será daqui ao Douro, não o sei. Este tal rio chamado Rabaçal corre longo e se passa em barcas em muitas partes e alguns dias se não pode andar com elas por serem as águas muitas.
É o que posso dizer deste rio, a serra e o lugar e não sei outra coisa de que possa dar notícia e de como tudo o que foi o declaro por mim dito, o que juro ser verdade in verbo sacerdotis, hoje, Lilela, doze de Março de mil e setecentos e cinquenta e oito anos.
O vigário, Padre Vicente Martins
O encomendado de Rio Torto, João Álvares
O pároco de Crasto, João Lopes
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