sábado, 10 de dezembro de 2011

DOCUMENTOS: Aldeias do concelho de Valpaços nos meados do século XVIII por freguesias - VILARTÃO

Por Leonel Salvado


Nota prévia: Prestes a finalizar esta série documental das Memórias Paroquiais das freguesias que pertencem actualmente o concelho de Valpaços, segue-se a transcrição do documento da antiga freguesia de Vilartão, já nele mencionado como um lugar freguesia de Bouçoais de que é hoje totalmente anexa. 

MEMÓRIAS PAROQUIAIS, 1758, Tomo 41, VILAR SÃO, Monforte de Rio Lima [leia-se VILARTÃO, Monforte de Rio Livre].
[Cota actual: Memórias paroquiais, vol. 41, n.º 308, p. 1869 a 1872]

Vilartão é um lugar da Freguesia de Bouçoães, Província de Moncorvo, Bispado de Miranda, termo de Monforte de Rio Livre. Dista da cabeça da Comarca ao Norte, onze léguas, e de Lisboa, capital do Reino ao mesmo rumo, oitenta léguas, e da cabeça do termo, que é Monforte, dista duas léguas para o Poente [e] de Miranda dista desasseis léguas para a parte do Noroeste.
É donatário deste termo de Monforte o Excelentíssimo [conde de] Atouguia.
É governado por juiz ordinário.
Passa por este lugar todas as semanas o correio da Praça de Bragança para Chaves, excepto quando as águas não permitem a passagem do rio, de que adiante se fará explícita menção.
Tem o dito lugar cinquenta e oito fogos; tem duzentas pessoas.
Tem a igreja matriz no fundo, para o Meio-dia, com a invocação de São Lourenço. Tem três altares [e] o maior é da dita invocação; o colateral da parte do Norte é do Santo Cristo e o da parte do Sul é de Nossa Senhora do Rosário. É um templo feito de novo, com seu frontispício ordinário e um sino só, porque a pobreza dos moradores não dá lugar para mais. Está a dita igreja já muito falta dos paramentos necessários, porque não tem fábrica ou rendimentos mais que o pobre zelo dos moradores. Tem uma Confraria do Santíssimo Sacramento, nem muito pobre, nem muito rica.
O Pároco da dita igreja é cura anual apresentado pelo Reverendo Abade de Bouçoães.
Tem uma capela com a invocação de Nossa Senhora da Expectação, sita [no] meio do Povo por onde passa a estrada. É a dita capela do antiquíssimo Morgado de Vilartão, cujo possuidor no tempo presente é Álvaro José de Morais Soares Carneiro, tenente de [Cavalaria] na guarnição e Praça de Chaves.
Está o dito povo mo meio da estrada mencionada, em terra descoberta e cercada pela parte do Norte e Sul de montes ásperos e rochedos inacessíveis que distam um quarto de légua.
Tem três fontes, uma para a parte do Norte, feita de cantaria lavrada, chamada a fonte do Ouro; outra, para a parte do Nascente, chamada a Fonte Arcada de que emanam abundantes, perenes e saborosas águas, frigidíssimas no Estio e bem temperadas no rigor do Inverno. Tem outra porá a parte do Poente chamada de Reguengo, cuja água não é tão abundante, mas muito delgada e sadia.

Tem este termo uma Serra chamada o Serro [Cerro= colina] da Esculca, para aparte do Nascente, a qual, levantando-se em altura bastante, vai logo descendo precipitadamente por espaço de um quarto de légua para o rio. São as ladeiras deste [Cerro] despenhadas, rasas e montuosas [de superf. acidentada], que principiam junto à Quinta de Picões e findam num ribeiro chamado da Quinta da Cavada, abarcando de distância, de uma a outra parte, quase uma légua. Não servem estes montes senão para lenhas e pastos de gado cabrum; passa por este precipício a estrada mencionada de Bragança para Chaves, ministrando [se] aos passageiras copiosas e frescas águas [de] uma fonte chamada da Esculca, que tomou o seu nome do [Cerro] referido.
Deste termo avistam-se as terras seguintes: Uma serra sita no termo de Bragança, bastante alta, no cume da qual se venera Nossa Senhora da Serra em seu templo ornado como permitem as possibilidades daquelas gentes. Avista[-se] outro templo de Nossa Senhora do Campo, em distância de seis léguas, um do outro. Descobre-se também deste termo outro Cerro muito alto chamado o Cerro de Bornes, em distância de oito léguas, de que darão cabal notícia seus vizinhos; mais outro templo de Nossa Senhora da Assunção, que dista nove léguas, sito em um alto cabeço em cuja faldra [falda=sopé] está o Lugar de Vilas-Boas; mais se avista deste termo o Cerro chamado de Santa Comba, em distância de seis ou sete léguas.
Os frutos que produz esta terra em mais abundância são pão-centeio, vinho ordinário, castanha, algumas frutas e hortaliças.
Da casa do antiquíssimo Morgado de Vilartão, tem florescido nas armas António de Sá Pereira do Lago que acabou a vida sendo sargento-mor de Cavalaria no Regimento Ligeiro na Província de Trás-os-Montes, e na promoção vinha feito coronel, cuja ocupação não chegou a lograr, porque a morte lhe cortou os fios da vida. Álvaro de Morais Soares, irmão do sobredito, faleceu sendo capitão de cavalos no mesmo Regimento, cujo pai de ambos, chamado Pedro Aires Soares, faleceu sendo Governador de Monforte e seu termo.

Finda o termo deste povo, para a parte do Nascente, em um rio chamado o Mente, que tem seu princípio no Reino de Galiza [e], pela parte do Norte e no mesmo termo deste lugar de Vilartão, desemboca em outro rio chamado o Rabaçal, que também corre pela parte do Norte das terras de Galiza para o Sul, conservado seu nome de Rabaçal até à Vila de Mirandela, junto à qual perde a sua denominação, porque lha usurpa outro rio chamado Tuela.
É o dito rio Mente bastante caudaloso, principalmente no tempo de Inverno, de tal sorte que não pode passar-se sem muito perigo, porque não tem ponte, excepto uma de madeira a três léguas daqui, junto à raia de Galiza, chamada a ponte de Segirei, e não há outra até à ponte chamada da Barca, junto ao Lugar de Vale de Telhas, distante, uma da outra, seis ou sete léguas.
Tem o dito Mente um porto chamado da Oliveira, por onde vai a estrada de Bragança para Chaves, que somente no Verão dá passagem, e no Inverno, tanto o correio como [o]s soldados e mais passageiros, dão uma tal volta, que rodeiam de cinco para seis léguas; tem nele perigado muita gente, como é bem notório.
Criam-se neste rio barbos, bogas e algumas trutas e escalos. Nas suas ribeiras, para esta parte do Poente, não se produzem frutos, por serem terras fragosas e desabridas.
Há no dito rio um moinho, no sítio da Ramisqueira, de que se servem os moradores de Vilartão.
Não houve, pela Misericórdia de Deus, nesta freguesia ruína alguma causada pelo terramoto de 1755. Nem também há coisa alguma digna de memória, de que se dê notícia.
Isto é o que posso dizer na verdade.

Vilartão, em Abril, 14 de 1758.

O cura, Padre João Rodrigues.

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