Por Leonel Salvado
Sugestionado pela curiosa ilustração (ao centro da imagem) que me foi disponibilizada pelo autor de BD Jorge Miguel, alusiva ao humilde enterro do sapateiro de Trancoso, Gonçalo Anes, o Bandarra - personagem celebrizada pelas suas proféticas trovas que alimentaram o mito do sebastianismo - e sensibilizado por um dos comentários que a propósito dessa mesma ilustração citava o histórico provérbio “Morra o homem, deixe a fama!” – que muitas vezes preferimos associar a outras figuras de dimensão histórica nacional, como é o caso de Camões - procurei pesquisar mais algumas informações sobre o sapateiro-profeta de Trancoso quando, mesmo a propósito, fui surpreendido por uma pequena história passada naquela cidade em 2007 que não resisto em trazê-la aqui. Ela poderá servir de teste à relevância do referido provérbio no nossos dias.
A História, contada por um membro da “comunidade Sol de blogs.sapo”com o pseudónimo de “contracorrente”, é a seguinte:
«Desde os meus tempos de escola que vivia com a curiosidade de conhecer a terra do célebre Bandarra, sapateiro de Trancoso e profeta do Quinto Império. Mas os anos foram-se passando e, só no passado mês de Novembro, a oportunidade surgiu.
Em Trancoso, como não podia deixar de ser, respira-se Bandarra por todo o lado. Na praça do município e em lugar de destaque, lá está a sua incontornável estátua. Daí partimos à procura da igreja onde está sepultado o nosso profeta. Como a igreja mais próxima se encontrava fechada, procurámos a dois jovens de 18-20 anos que ali se encontravam se era naquela igreja que estava sepultado o Bandarra. “Bandarra? Não conhecemos nenhum Bandarra…” E perante a nossa estupefacção, justificaram-se: “Nós não somos de cá, só aqui andamos a estudar…”. A estudar? A ignorância desta juventude é um espanto.
Mas como o posto da GNR era pegado com a igreja, a minha mãe procurou informar-se ali. A reacção do soldado da GNR de serviço foi idêntica à dos jovens estudantes: «o Bandarra? Nunca ouvi falar…» O homem devia estar a gozar connosco. Como é possível, estando Trancoso coberta de placas, estátuas e outras indicações com o nome do Bandarra, um soldado da GNR fazer o turno pela povoação sem nunca ter lido este nome? A não ser que não saiba ler…
Bem, saímos do posto e… o que é que vimos diante de nós? Uma lápide enorme na parede lateral da igreja e de frente para a porta do posto da GNR com um texto que tinha o seguinte título: “Túmulo do Bandarra” […]»
Será possível que, apesar do monumento e das informações escritas, o Bandarra seja hoje um desconhecido na sua própria terra?! São cada vez mais numerosos os exemplos de histórias como esta que nos induzem a interrogar se estaremos a viver uma época de crise da nossa memória histórica, e se estas histórias poderão ser entendidas como verdadeiros sintomas de uma qualquer estirpe de “amnésia colectiva” que ameaça tornar-se endémica na sociedade portuguesa.
O sumptuoso túmulo do “profeta do Quinto Império” composto por um belo epitáfio ostentando como divisa os instrumentos do seu ofício de sapateiro existente no interior da igreja de São Pedro em Trancoso, foi mandado construir em 1641 por D. Álvaro de Abranches da Câmara, General da Província da Beira, em substituição da primeira pobre sepultura que lhe foi dada em 1556.
Pois é!
ResponderEliminarFalta a sensibilidade para apreciar e saber do que é nosso e que é importante.
Mas aqui está este cantinho para nos fazer recordar e ou aprender.
Parabéns por isso!
cmps
leonor moreira