domingo, 31 de outubro de 2010

Ecos da participação trasmontana na 1ª Guerra Mundial


Cemitério Militar Português de Richebourg onde estão sepultados 1884 militares mortos na 1ª Guerra Mundial 
A Primeira Guerra Mundial

No estado actual da memória colectiva da sociedade ocidental e, em particular da sociedade portuguesa, o holocausto nazi, as perdas humanas e materiais da 2ª Guerra Mundial, a guerra colonial e a repressão do Estado Novo, são os lugares-comuns, diria mesmo, forçando a expressão, os mais comuns, no âmbito dos mais violentos e brutais males cometidos pelo Homem e pelos regimes políticos durante as últimas duas centúrias. O genocídio praticado pela Turquia contra os Arménios, o brutal número de vítimas do regime estalinista ou, ainda mais recentemente, os iguais crimes contra a Humanidade cometidos no Ruanda, são raramente invocados. Claro que esta situação tem a ver, sobretudo nos dois primeiros casos, com a premeditada política de isolamento adoptada respectivos estados e o consequente alheamento ou até o próprio desinteresse da sociedade ocidental a respeito do que aí se passava. Situação bem diferente é a que explica a vaga memória que se guarda em Portugal relativamente ao seu envolvimento na 1ª Guerra Mundial, e esta só pode, a meu ver, ser explicada por razões que se prendem com as próprias circunstâncias da subsequente evolução política portuguesa de mais de meio século. Esse acontecimento de “má memória”, favorecido por um regime da mesma sorte, que por escasso tempo lhe sobreviveu, seria doravante recalcado pelas sucessivas ditaduras e particularmente pelo exacerbado sentimento de orgulho patriótico que o Estado Novo acalentou. Nestas quase quatro décadas de democracia têm-se notado alguns esforços no sentido de resgatar para a História a memória dos portugueses que tombaram na Flandres ou regressaram estropiados das terríficas trincheiras. Alguns meios de comunicação social vêm assumido um papel relevante nessa missão e o mesmo se diga do Ministério da Educação e de um número considerável de Escolas que aderiram ao Programa de Actividades para as Comemorações do I Centenário da República.


A Batalha de La Lys

Vejamos um resumo desse confronto desigual de violência, brutalidade e horror que ficou conhecida como a desastrosa batalha de La Lys, há 92 anos e meio, e de que só com a batalha de Alcácer Quibir, há 432 anos, se pode achar algum paralelismo na História Militar Portuguesa (Os dados relativos às baixas são discutíveis!):

“Batalha travada em 9 de Abril de 1918, durante a Primeira Guerra Mundial, entre as forças da Alemanha e do Império Austro-Húngaro, por um lado, e a coligação de países em que se destacavam a Inglaterra, a França e Portugal, por outro. A batalha decorreu numa planície pantanosa banhada pelo Rio Lys e seus afluentes. As forças portuguesas assumiram a disposição de um trapézio, cuja face voltada para o inimigo se estendia por 11 km, e dispuseram-se em três linhas de defesa. Este foi um dos mais sangrentos confrontos em que esteve envolvido o Corpo Expedicionário Português, que aqui teve as seguintes baixas: 1341 mortos, 4626 feridos, 1932 desaparecidos e 7440 prisioneiros.”

In Infopédia, Porto: Porto Editora, 2003-2010. [Consult. 2010-10-31].
Disponível na www: .

Trás-os-Montes e a 1ª Guerra Mundial – um estudo por fazer

A participação de Portugal na Primeira Guerra Mundial constitui um tema historiográfico de relevância nacional, regional e local. Julgo estar ainda por fazer um estudo específico de âmbito regional e local sobre o tema relativo ao distrito de Vila Real e ao concelho de Valpaços que seria de grande interesse e de justa homenagem aos nossos conterrâneos que passaram pelas agruras dessa guerra.
De momento, apenas posso salientar dois dados de interesse regional e local, respectivamente, que considero serem dois nítidos ecos acerca da participação de gente transmontana nessa guerra:

1. O primeiro é que, curiosamente, foi trasmontano um dos mais destacados heróis lusos desse esforço de guerra de resultados desastrosos, o soldado Aníbal Augusto Milhais, conhecido por s”oldado Milhais” e mais tarde por “soldado Milhões”, que nasceu em 9 de Julho de 1895 no lugar de Carvas, paróquia de Valongo, do concelho de Murça. A sua biografia, incluindo vários detalhes sobre os seus lendários feitos e as suas honras militares, encontra-se publicada em vários locais, designadamente no Volume I do “Dicionário dos mais Ilustres Transmontanos e Alto Durienses”, coordenado por Barrosos da Fonte, que levaremos em conta numa futura publicação dedicada a essa personagem.

2. O Segundo dado, é uma informação indirecta da existência, no concelho Valpaços, em 1923, de mutilados da 1ª Guerra Mundial, informação essa que se retira de um excerto da Monografia de Joaquim de Castro Lopo, “O Concelho de Valpaços, Por Valbel” que passo a transcrever:

“A 2 de Agosto de 1923 recolheu-se no cofre da Associação Beneficente Municipal a quantia de Esc. 914$40, proveniente do produto de uma festa que se realizou em Valpaços e nalgumas aldeias do mesmo concelho com o nome de Festa da Flor. Esta quantia era destinada para os mutilados da Grande Guerra; mas, por motivos que se ignoram reverteu para o Hospital com assentimento dos promotores daquela festa e dos que para ela contribuíram”

In “O Concelho de Valpaços, Por Valbel”, 1954 Tipografia Minerva, LM, p.57

Ainda que seja indeterminado o número de estropiados de guerra valpacenses na data mencionada, e lamentável a decisão dos promotores e dos contribuintes da verba que lhes estava destinada, arrisco-me a supor, com base no tipo de iniciativa que no excerto se descreve, que eles seriam em número significativo.

Reservei para o fim a parte de um documentário, passado na RT2 sobre a 1ª Guerra Mundial e o desastre da Batalha de La Lys, para que se haja em vista as imagens, reais e encenadas, que exprimem o ambiente de violência, brutalidade e horror porque passaram os nossos compatriotas e os nossos conterrâneos.




Imagem de entrada: http://www.operacional.pt/91%C2%BA-aniversario-da-batalha-de-la-lys/

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